sábado, 20 de agosto de 2011

Conto de ficção científica


OS ESTRANHOS DA NOITE
Terror / FC (com elementos steampunk)
Escrito por Afonso Luiz Pereira



Abril de 1889. 
        Estava com medo! Muito medo! Não conseguia afastar os olhos esbugalhados de uma das frestas da cortina que cobria a janela frontal de sua velha morada. Alois, o marido, um bem sucedido guarda de alfândegas, não se encontrava em casa, mas tivera o bom senso de não deixá-la totalmente desprotegida. Através da influência de seu posto, conseguira confiscar um dos autômatos humanóides vindos da Inglaterra para fortalecer o exército do Império. A criatura cilíndrica metálica, que mais parecia um enorme pepino com braços e pernas, se locomovia feito gente e ocultava nas suas laterais armas de fogo retráteis de poder devastador. Apesar da forte oposição que fizera contra a ideia de se manter aquela coisa como cão de guarda da casa, dava graças a Deus, naquela fatídica noite, à arrogância e à teimosia do marido.
        Os quatro estranhos lá fora queriam a criança que estava na sua barriga!  Eu sei. Eu sinto. Eles querem o meu bebê! Não sabia determinar bem qual a razão, mas desconfiou assim que os viu parados em atitude muito suspeita dentro dos limites do seu quintal. Então, sem saber como proceder, desligara os refletores portáteis instalados no umbral da porta e deixara os invasores envoltos sob a luz de uma acanhada lamparina a óleo, aparelho ainda em uso dos costumes antigos das regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos; era uma luz fraca, mortiça, que teimosamente impunha sua luminescência medíocre contra uma das noites mais escuras do século. O vento forte açoitava a pequena lâmpada dependurada na frente do sobrado fazendo-a tremeluzir para todos os lados, imprimindo efeitos grotescos de luz nas fisionomias indiferentes dos quatro homens. A ventania castigava as árvores, assoviava alto, levantava as folhas secas do chão em miúdos redemoinhos e penetrava audaciosamente às frestas das portas e janelas. Dava-lhe a impressão de que o vento impetuoso queria trazer a morte para dentro de casa!
        — Johann.  Vá até ao quarto dos fundos e veja se as crianças estão dormindo. – Ordenou ao autômato, pela primeira vez, em tom afável. Trazia consigo sérias restrições de convívio com aquela criatura metálica, a começar pelo esquema dos comandos de voz, porque detestava a brincadeira de mal gosto do marido ao atribuir o nome do velho Johann, seu pai, àquela máquina.
        O robô prontamente atendeu a ordem, indo averiguar as condições físicas de seus enteados, filhos de Alois com a primeira esposa já falecida. A situação era realmente preocupante. Não havia mais ninguém ali além dela, das duas crianças miúdas e daquele protótipo gigante de legume mecanizado. Sempre se preocupara pelo fato da casa ficar afastada da vila. Achava que não era certo, indecente até, uma mulher passar a noite sozinha com os pequenos, ainda mais considerando a sua delicada situação: grávida de oito meses!
        O bebê, agitado naquela noite inamistosa, parecia brigar contra suas entranhas. As fisgadas de dor no baixo ventre aumentavam a cada minuto. Por mais que tentasse acalmar-se, não conseguia tirar do pensamento os homens sinistros plantados no jardim. Eles portavam espadas longas, brilhantes, muito bem trabalhadas no antigo ofício das forjas medievais! As armas, é bem verdade, deixaram-na extremamente nervosa, no entanto, o que lhe causou arrepios de medo pelo corpo inteiro foi o momento exato em que percebeu os olhos deles. Os olhos dos estranhos estavam esbranquiçados, conferindo-lhes a espantosa impressão de não terem vida! Eles estão possuídos, determinou convicta para si.
        Vencendo o medo, abriu cuidadosamente alguns centímetros da fenda balouçante da cortina agitada pelo vento e obrigou-se a espiar um pouco mais aquelas figuras invasoras,  ao invés de lançar as furtivas olhadelas que houvera dado até aquele momento. Depois de alguns segundos preciosos, atenta, tomou novo susto, levando instintivamente as duas mãos à boca para sufocar o grito de horror. Meu Senhor Bom Jesus, aquele é Gustav Decker, o açougueiro da vila! Mas lá fora, não! Não era ele! Assim como, decerto, os outros também não haveriam de ser. Sendo uma “intuitiva”, sustentava a firme convicção de que eles estavam ali para levar a criança antes de nascer. Sentiu horror ao pensar nisso. Às vezes, tinha pena de si mesmo porque, apesar de jovem, se considerava uma mulher muito sofrida, e de pouca sorte na vida. Casara-se com um homem insensível e bruto, 23 anos mais velho, e com ele já tivera 3 filhos: uma menina e dois meninos. Todos mortos! Não tivera, portanto, a boa sorte de ver nenhum deles crescer o suficiente para brincar sozinho no quintal. E agora aquilo!
        A despeito do medo, do nervosismo, das dores que lhe poderiam induzir às contrações de um parto prematuro, pensou seriamente em fugir com os enteados pela porta dos fundos. O problema em questão era embrenharam-se na mata fechada adentro e atropelarem as próprias pernas em meio à escuridão da noite. Ademais, como se já não bastasse tais contratempos, ainda teriam de enfrentar a ventania que prenunciava, juntamente com a cadeia intermitente de relâmpagos que riscavam a abóbada negra do vale, uma forte tempestade que há muito não se via por aqueles lados.  Talvez fosse o caso de se pensar naquele caminho como a única alternativa de escape, mesmo correndo o risco de cair facilmente numa emboscada dos estranhos dentro da mata fechada. Já estava prestes a dar início ao plano de fuga, abandonado a janela, quando um farfalhar de passos urgentes redobrou-lhe o sentido de alerta: um elemento novo, surpreendentemente, se apresentava em cena!
        Mal pôde acreditar no que estava vendo: em meio à revoada das folhas das árvores, saído das brenhas escuras da floresta, um quinto homem atirou-se em desabalada carreira com o objetivo de tomar posição dentro do quintal. O impressionante guerreiro, também de espada em punho, destoava dos outros por trajar um vistoso sobretudo preto. O casaco comprido, esvoaçante ao sabor dos rodopios do vento tempestuoso, emprestava-lhe uma aura de poder, afigurando-lhe um porte nobre, de grande bravura. Após tomar o espaço que estrategicamente melhor lhe convinha, o elegante espadachim fincou as botas de cano alto no gramado e elevou acintosamente a sua lâmina acima da cintura, deixando bem claro a firme intenção de se opor ao quarteto sinistro. Tratava-se de mais um completo desconhecido para ela, porém, aquele inspirava segurança! O senhor ouviu as minhas preces! É um anjo vindo das alturas neste momento de desespero! A intuição poucas vezes abandonara-lhe em julgamentos importantes para dirimir os seus caminhos. Deus ouvira seus apelos no sentido de não causar-lhe mais infortúnios. E, pensando assim, não teve dúvidas: o novo elemento em cena estava ali para ajudar!
        A primeira coisa que chamou a atenção dela foi o fato dos invasores reconhecerem o recém-chegado, respeitando-o com muita cautela. Sem dizer uma única palavra os quatros voltaram-se todos para o Sobretudo Negro, de modo hostil.  Erguendo as espadas com as duas mãos à frente, eles iniciaram movimentos lentos, cuidadosos, na inequívoca intenção de colocá-lo numa posição em que pudessem atacá-lo de todos os lados, inclusive a partir de sua retaguarda. O recém-chegado, percebendo a manobra, recuou de modo igualmente cadenciado, empenhando todos os esforços no sentido de manter os oponentes à sua mercê e, ao mesmo tempo, levar as suas costas à base de um tronco grosso de uma das enormes árvores que circundavam o quintal.
        Não obstante a postura firme e decidida de um guerreiro experiente, ela teve a incômoda certeza de que o Sobretudo Negro não poderia suportar o ataque dos quatros invasores ao mesmo tempo. Precisava ajudá-lo de alguma forma! Mas onde diabo Johann está? E antes de gritar desesperadamente por seu nome, o autômato, com os barulhos típicos das engrenagens valvuladas por falta de óleo, que sempre a incomodavam, apareceu tranquilamente no centro da sala, vindo do quarto dos fundos.
        — Crianças estar bem, senhora. – Informou o legume mecanizado, utilizando os seus parcos recursos de expressão vocabular numa voz aguda, metálica.
        — Johann.  Venha aqui. Rápido! Rápido! – Intimou se dirigindo ao hall de entrada tão depressa quanto a sua condição de gravidez permitia.
        O robô, apesar da falta de objetividade de diretrizes claras de comando, não contestou a ordem da jovem senhora. Encaminhou-se à entrada principal da casa em quatro passadas largas, desengonçadas e barulhentas. Ela sentiu o assoalho de madeira envernizada tremer sob seus pés. Abriu a porta decidida, recebendo as primeiras lufadas de vento frio com altivez, enquanto as folhas secas e outros detritos leves oriundos da floresta invadiam a sala. Olhou esperançosa para o autômato, apontou o dedo indicador para fora e imprimiu à voz o tom mais firme possível:
        — Johann. Observe atentamente os cincos homens lá fora! Identifique o mais alto deles, aquele de cabelos compridos, vestido com um sobretudo preto. Refiro-me ao que segura a espada em atitude de defesa.
        O robô levou uns poucos segundos para analisar a informação. Duas pequenas esferas prateadas, os olhos rastreadores da máquina, localizados quase na extremidade superior do tampo arredondado do cilindro, lampejaram de modo intermitente, emitindo dezenas de cliques num espaço reduzido de tempo como se estivessem a registrar uma porção de imagens.
        — Identificado, senhora. 
       — Johann, proteja a vida do homem identificado. Proteja-o de seus inimigos. Vá, agora! De pressa! Anda! Anda!
        O robô deu um largo passo para trás, afastando-se do hall de entrada com o intuito de avaliar a altura do umbral da porta que, naquele momento, era menor do que a sua provisória estatura. Johann, é bom esclarecer, antes de começar o cerco misterioso, estava trocando as velhas lamparinas a óleo dependuradas no teto por lâmpadas elétricas a pedido de Alois. Fez pouco caso do uso da pequena escada guardada no quarto de hóspedes. O que, afinal, ele está esperando? Ansiosa, olhou novamente para fora, enfrentando ainda as poderosas lufadas de vento frio e, ao constatar que o Sobretudo Negro encontrava-se cada vez mais encurralado, começou a dar pulinhos nervosos, agitando as mãos como se tal gesto pudesse apressar o processo de retração das extremidades cilíndricas do autômato. Depressa, depressa, pelo amor de Deus!!! O processo de retração e ajuste da parte superior dentro da parte inferior levaria os costumeiros 25 segundos. Quando pensou em gritar para que Johan se apressasse, o robô inesperadamente emitiu estranhos rangidos nas articulações e, semelhante uma árvore cortada em sua base, quedou o corpo cilíndrico à frente, dobrando os membros inferiores e escorou toda a sua estrutura em linha horizontal nos membros superiores também.
        Mas que diabo ele está...
        Johann, agora como um quadrúpede, surpreendentemente, imprimiu trotes rápidos e saiu de casa para cumprir a ordem determinada. Ela, por sua vez, enfrentou a ventania empurrando a porta com dificuldade, trancando-a, para depois correr à janela. Desta vez, dispensou os melindres das discretas espiadelas para puxar toda a cortina para o lado. Sem a cautela de antes, colou o rosto na vidraça, esforçando-se ao máximo para acompanhar a movimentação dos elementos misteriosos no campo penumbroso mais remoto do jardim, onde a fraca luz da lamparina minguava-se diante das forças ocultas que preferiam o isolamento tácito para confrontar-se. No entanto, a penumbra durou pouco! Dois fachos de uma luz intensa, provenientes dos holofotes laterais do autômato, cortaram a noite e chocaram-se contra os guerreiros. A luz alta dos holofotes de Johann, antes de surpreendê-los, como seria de se esperar, muito pelo contrário, acendeu instantaneamente o estopim da refrega.
        O primeiro estranho que ousou levantar a espada para lograr o primeiro golpe contra o Sobretudo Negro não chegou a desferí-la porque foi, subitamente, acometido de tremores convulsivos violentos, acompanhados por pequenas explosões de inúmeras e minúsculas lascas de carne e ossos, banhados em sangue, à medida que os projéteis em rápida sucessão, lançados da arma de alta rotação do robô, varavam-lhe o corpo.  Meu senhor Jesus Cristo!  Afogueada pela visão da chacina, ensurdecida pelo matraquear barulhento da metralhadora, ela pulou para trás quase indo ao chão. O coração disparou. Uma dor excruciante partiu do baixo ventre e sentiu a água descer em grande quantidade por suas pernas trêmulas.  Ele vai nascer, ele vai nascer, e vai ser hoje!Respirou fundo. Não podia perder tempo porque precisava saber em que pé encontrava-se o combate lá fora. Já ia escorar a testa novamente à janela quando as crianças irromperam à sala assustadas.
        — Tia Klara, tia Klara! O que está acontecendo? – choramingou nervoso o menino, com a menina a reboque aos prantos também.
        E agora? Mais essa, ainda? Era só o que me faltava!
       Não havia tempo para explicações. Respirou fundo pela segunda vez, segurou novamente o baixo ventre com força, contraiu a fisionomia numa carranca e rezou para ser obedecida sem discussão. Apontou o dedo indicador na direção do corredor de onde os pequenos desesperados acabavam de vir.
        Tenho de ser firme com eles.
        — Vocês dois! De volta para o quarto! - Ordenou determinada.
        — Mas, tia Klara...
        Eles fizeram menção de atravessar a sala, porém se detiveram de súbito, de olhos esbugalhados, estáticos, quando o matraquear da metralhadora se fez ouvir com estrondo novamente acima do zunido dos ventos rodopiantes que estremeciam as paredes cansadas do velho sobrado.
        — Para o quarto! – intimou elevando um tanto mais o tom de voz.
        — Mas tia...
        — Agora!!! – Ela berrou tão alto que chegou a suprimir por um breve momento o barulho da ventania e o ruído cortante da metralhadora giratória de Johann.
        As crianças deram meia-volta e sumiram no corredor.
        Meu Deus, onde Alois estava com a cabeça quando resolveu trazer esta máquina de matar para dentro de casa?
        Tornou a espremer o rosto contorcido de dor de encontro ao vidro da janela. A cena, então, assim se lhe afigurava: duas massas ensanguentadas encontravam-se inertes, afundadas na grama espessa e alta do jardim. Dezenas de folhas secas, embaladas pelos redemoinhos de vento, colavam-se nos corpos disformes. Esforçando por desviar os olhos daquele espetáculo grotesco, ela lançou a sua atenção para os outros dois sobreviventes do massacre que, por razões óbvias, afastaram-se rapidamente do Sobretudo Negro. O autômato, sem a menor hesitação, baixou a metralhadora giratória.
        Não faça isso! Não, criatura burra, não faça isso!
       Os dois estranhos sobreviventes entreolharam-se por um breve momento, coisa de poucos segundos, contudo foi o suficiente para perceber a vulnerabilidade do robô diante das circunstâncias emergenciais que ela própria lhe impusera: a dupla sinistra, numa velocidade impressionante, sobre-humana, começou a correr em círculos, de espadas em riste, em volta do autômato. Ao perceber a manobra evasiva, Johann demorou segundos preciosos para decidir qual a estratégia adotar diante do novo contexto: se estivesse sobre os membros inferiores, na vertical, a parte cilíndrica superior acompanharia o movimento circular dos inimigos alvejando-os facilmente, no entanto, na posição horizontal, o corpo metálico inteiro teria de girar sob os movimentos sincronizados dos quatro suportes metálicos, que faziam as vezes de braços e pernas do autômato. Ele não teria tempo hábil para se postar de pé! O Sobretudo Negro, aproveitando-se da situação, decidiu levar combate ao adversário mais próximo dele em relação à órbita circular em torno da máquina robótica. O rudimentar engenho central analítico-matemático de Johann, viciado nas tarefas domésticas sugeridas pela jovem mulher, travou diante do impasse dos comandos de programação para definir prioridades: defender o homem de cabelos compridos ou defender a si próprio do ataque contra a sua retaguarda, eis a questão!
        Quando o autômato, dentro de seu tempo efêmero de processo analítico, decidiu priorizar a ordem da jovem senhora, iniciando o alinhamento da metralhadora para desferir as rajadas devastadoras contra o elemento hostil à vida de quem deveria proteger, o suposto Gustav Decker, livre da alça da mira mortal, abandonou imediatamente a sua trajetória circular e partiu como uma flecha para dentro da lateral do autômato.  O açougueiro possuído, tomando impulso em corrida, deu um salto impressionante e, mal os seus pés tocaram o solo, desceu a espada com força para aplicar um golpe violentíssimo, que chegou a cortar as ligas de metais no centro do robô como se fosse uma faca de gume afiadíssimo a dividir, num único e preciso talho, uma simples cenoura ao meio. A estrutura oblonga de Johann se arriou instantaneamente sob as quatro patas no chão orvalhado do quintal. As entranhas de fios, válvulas, engrenagens, pistões, bielas, cilindros de combustão a vapor, pularam para fora de ambas as partes separadas, provocando chiados, fumaça e muitas faíscas.
        Agora, eram dois contra um!
        Enquanto Gustav Decker tentava desvencilhar a espada das correias, fios e engrenagens da carcaça metálica faiscante, o Sobretudo Negro entregava-se a um embate intenso com o outro estranho. Nenhum dos dois em momento algum ousou emitir qualquer palavra, grito de guerra ou lamento de dor dos ferimentos letais. A agilidade deles impressionava! Klara Jamais tinha visto semelhantes habilidades para pular, correr e flexionar acentuadamente a coluna vertebral para esquivar-se de maneira tão rápida! E foi naquele exato momento, concluído o insólito desfecho do combate, que se deu a confirmação de forma indubitável às suas desconfianças: os que lutavam no quintal penumbroso eram realmente figuras sobrenaturais! O Sobretudo Negro, depois de esquivar-se por diversas vezes seguidas, desferiu um golpe preciso, atingindo o pescoço de seu adversário, fazendo a cabeça dele despencar do corpo, assim como uma fruta madura costuma despencar da árvore. E ela testemunhou a mais estarrecedora das cenas, das várias que tão vividamente carregou nas lembranças para o resto de seus dias: do corpo do estranho amontoado no chão se desprendeu uma silhueta etérea levemente brilhante, parecendo humana, fantasmagórica! Klara quase surtou quando aquela forma luzidia, de aspecto irreal e sinistro, ficou suspensa a um metro e meio do chão e, não mais que dois segundos, entrou no corpo do companheiro vivo!
        Meu Deus, dá-me proteção! É uma legião de criaturas infernais!
       Gustav Decker, após ter recebido a forma etérea, grunhiu umas poucas palavras na direção do Sobretudo Negro num idioma que não haveria com certeza de ser deste plano terreno. Após ter livrado a espada da carcaça destruída do robô, deu-se conta de não ter condições de vencer o seu adversário em igualdade de condições. Por isso, num ato instintivo, correu em direção à casa.
        Era uma tentativa desesperada de arrombar a porta e chegar até ela!
       Klara imediatamente se afastou da janela recuando para o centro da pequena sala. Pensou em fugir, mas as crianças sob a sua tutela impediram-lhe o ímpeto da fuga. Começou a torcer novamente as mãos, nervosa. Tinha esperança de que toda a pirotecnia ruidosa do armamento de Johann, mais o retinir dos entrechoques das espadas, pudessem atrair a curiosidade dos habitantes da vila, porém o troar encorpado da tempestade em formação arrefeceu sua confiança na intervenção dos vizinhos. Começou a rezar o Pai Nosso outra vez enquanto tentava ignorar os guerreiros se digladiando e friccionando seus corpos na parede frontal em luta acirrada. Finalmente, depois de pouco mais de um minuto de luta intensa, ouviu-se o barulho de um dos corpos a desabar nas tábuas da área coberta de sua velha casa.
        A batalha terminara!Sustentou o olhar fixo no hall de entrada, quase numa espécie de transe, porque sabia que dependendo de quem por ali entrasse, ela viveria ou morreria. A maçaneta interna girou impaciente para os dois lados, as trancas metálicas saltaram dos caixilhos e instantaneamente a porta escancarou-se para fora violentamente. O coração dela logo se acalmou quando viu o Sobretudo Negro em pé com um corte feio no rosto. O sangue lhe brotava abundante dos ferimentos nos braços e pernas, mas se ele sentia dor, fez questão de não o demonstrar. Não lhe passou despercebido o fato do seu “anjo protetor” possuir olhos esbranquiçados também! Procurou não se ater muito na questão. Quem quer que fosse o homem que se avultava à entrada da porta, assim como os outros estranhos mortos, igualmente estava possuído por uma entidade que não pertencia a este mundo.
        O poderoso ser entrou na sala sem pedir licença. Entrou decidido, confiante. Olhou atentamente à sua volumosa barriga. Sentiu que sob o ponto de vista dele, ela não passava de um simples recipiente que sucedia casualmente possuir algo de valor inestimável. Ele continuou a observar com interesse à sua barriga enquanto se aproximava, sem pressa, porque não queria assustá-la. Como por milagre as dores no baixo ventre se amenizaram dentro do suportável. Quando chegou bem perto, ele pediu num tom de voz firme, incomum, acostumado a ordenar e ser obedecido:
        — Posso?
        Ela não disse nada, mas fez sinal de aquiescência.
        Ele tocou a sua barriga. Deslizou a mão suavemente para os lados.
        — É um menino. Eu sinto que é um menino. – Ela informou com a voz embargada pela emoção, entre lágrimas, buscando o olhar esbranquiçado do seu salvador.
        — Sim. De fato é. Ele está bem. E virá à luz esta noite.
        — Por que você arriscou a sua vida por nós?
       — Precisava fazê-lo.
       — Você é um anjo, não é?
       — Sim, – ele sorriu levemente – de certa forma, sou sim... um anjo! Mulher, tu deves prestar muita atenção no que tenho a te dizer. Tu jamais tocarás neste assunto com ninguém. É para a própria segurança dele, entendes? Não me perguntes como, mas sei que tu já perdeste 3 filhos. Sei que não queres passar por tudo isso de novo!
        — Claro que não!
        — Muito bem! Faças o que te digo! Teu filho é uma criança abençoada. Ele será um grande líder. Através das gerações futuras dos autômatos, esta criança levará a palavra do Senhor por todos os continentes e realizará proezas que serão lembradas por séculos após a sua morte!
        — Como você pode saber de tantas coisas?
        — “Ele” me enviou para protegê-lo.
        Ela não disse nada. Apenas assentiu novamente com a cabeça.
        — Preciso ir agora, pois logo os moradores da vila estarão aqui. Eles irão te ajudar no parto. Vou limpar a sujeira aí fora. Esqueças o que presenciaste esta noite.
        O poderoso estranho deu as costas a ela e se afastou decidido a ir-se embora, no entanto, parou no hall de entrada, sem voltar-se. As órbitas esbranquiçadas da criatura brilharam por um instante! Ele precisava lhe fazer uma única pergunta, como se tal questionamento pudesse oferecer-lhe a confirmação da importância do seu trabalho.
        — Mulher, tu já pensaste no nome que irás dar a esta criança?
        — Sim! Claro que sim! Sempre soube que seria um menino e ...
        — Que nome?
        Klara Pölzl, prima em segundo grau e a terceira esposa de Alois Schicklgruber, filha de Johann Pölzl, predestinada a morrer em decorrência de cancro mamário aos 47 anos, não titubeou ao responder:
        — Ele se chamará Adolf Hitler!


        Adramalech, o estranho de sobretudo preto, o demônio sumeriano mais antigo das legiões de seu Senhor, sorriu satisfeito diante da visão de milhares de homens e máquinas humanóides em febril união erguerem orgulhosamente as mãos para saudarem aquele que viria, em futuro breve, trazer o caos à ordem estabelecida. Em seguida, ele pegou os corpos desencarnados de seus inimigos, arrastando-os pelas roupas, e sumiu na escuridão da noite!

http://simonnemachado.blogspot.com.br/


Professora  Psicopedagoga Simonne Machado

Seja Bem Vindo

EDUCAÇÃO, INFORMAÇÕES,ATUALIDADES, DICAS,TECNOLOGIA: SUAS DIFICULDADES , NOVIDADES E SISTEMAS DE SEGURANÇA DIGITAIS,INTERNET,REDES SOCIAIS, COMPUTADORES SOFTWARES ÚTEIS e MUITA, MUITA LÍNGUA MATERNA
Espero sinceramente ser útil a você.

Muita Luz e Paz!

Professora Simone Calixto